1. Carta ao editor
Gravidez de adolescência: uma questão social
A gravidez na adolescência, fato amplamente discutido atualmente nos meios acadêmicos, mídia e órgãos governamentais, longe de representar um acontecimento novo, esteve sempre presente na história da humanidade. Nas civilizações antigas, tão logo aparecessem os primeiros sinais de puberdade, a jovem era considerada apta para o casamento. Presença comum no passado de cada um de nós é facilmente reconhecida em nossas memórias e nos álbuns de família, onde aparecem nossas mães, avós ou bisavós, ainda em tenra idade, cercadas de numerosa prole.
A capacidade reprodutiva, àquela época, estava associada ao frescor da juventude e quanto maior a prole, maior o "mérito da matrona". Nada questionava-se quanto a capacidade psicobiológica daquelas imaturas jovens em parir, cuidar e educar seus filhos.
A igreja católica, detentora de grande poder sobre as questões da sexualidade e reprodução, propagava o " crescei e multiplicai". Exercendo forte repressão sexual e radicalmente contrária ao uso de qualquer tipo de método contraceptivo, contribuía para os 12, 15 ou 20 filhos presentes na maioria das famílias. Somando-se aos fatores culturais e religiosos, havia os interesses políticos e econômicos vigentes.
O Estado dependia do rápido crescimento da mão de obra para concretizar sua expansão e impulsionar as grandes transformações da época, o que tornou o crescimento populacional desejado e incentivado. A quem se destinariam então os serviços de pré-natal e planejamento familiar?
Neste contexto, as mulheres, longe de qualquer expressão social ou política viviam submissas ao marido e senhor e detentoras da "sagrada missão da maternidade" tinham como único legado: casar, procriar e zelar pelos filhos, cabendo ao homem, chefiar e prover adequadamente a família.
Na década de 60, com o movimento de contracultura, os jovens começaram a questionar as políticas sociais vigentes e, além disto, reivindicaram o direito ao livre exercício da sexualidade. Contrariando os rígidos padrões morais, a gravidez passou a ocorrer fora dos laços matrimoniais.
O crescimento populacional tornara-se preocupante e, a então, explosão demográfica somada ao processo maciço de industrialização tornou o trabalho humano "dispensável". O excedente de mão de obra, o desemprego e o futuro dos jovens passaram a ser preocupações para o Estado.
Os acontecimentos sócio-político-econômicos e as transformações ocorridas no âmbito da moral e dos costumes levaram, invariavelmente, o Estado e a sociedade a um novo posicionamento em relação aos padrões sexuais adotados pelos jovens "modernos".
Neste momento, o controle da natalidade tornara-se uma alternativa para conter este processo e os métodos contraceptivos passaram a ser mais divulgados.
Nos idos de 60, surgiram as pílulas anticoncepcionais e criaram-se os primeiros serviços de pré-natal voltados às jovens gestantes. A implantação efetiva dos programas de planejamento familiar permitiu às mulheres e ao Estado o controle sobre a prole.
Nos países em desenvolvimento, fazia-se necessário, mais do que o planejamento familiar, o controle definitivo sobre o número de filhos. Realizou-se, então, nas décadas de 80 e 90, a esterilização de grande número de mulheres jovens em idade fértil, tornando-a hoje, o segundo método contraceptivo mais utilizado pelas jovens brasileiras em união (8%), precedido apenas pelas pílulas anticoncepcionais (PNDS-96).
As progressivas transformações no âmbito da sexualidade dos jovens continuaram ocorrendo, e hoje, a iniciação sexual, ocorrendo cada vez mais precocemente, torna-os alvo de reocupações. A sexualidade, presente em todas as etapas do desenvolvimento humano, aflora com toda sua força na adolescência sobre influência dos hormônios sexuais. Responsáveis pelo aparecimento dos caracteres sexuais secundários conduzem a um novo "olhar" para o sexo oposto, antes indiferente.
Donos de um corpo em crescente transformação e regidos por uma mente ávida de novas experiências, trilham pelos caminhos da curiosidade e do desejo, ainda incontrolável. Alguns com pouco ou nenhum conhecimento da fisiologia do corpo, agora reprodutivo, outros, carregados de conhecimentos científicos e das "sábias" orientações paternas, seguem indistintamente pelos mesmos caminhos. Apoiados no pensamento mágico "isso não acontecerá comigo" e levados pelo calor do momento lançam-se nas mais diversas experiências, entre elas a do sexo desprotegido.
Independente do meio social em que estejam inseridos e do conhecimento prévio dos métodos contraceptivos, expõem-se, frequentemente, ao risco da gestação não planejada.
No Brasil, 50% das jovens e 78% dos jovens têm a sua primeira experiência sexual até os 24 anos de idade, com idade mediana da sexarca de 16,4 anos para as garotas e 15,3 anos para os rapazes (1996). Apenas 33% dos jovens relatam uso de contracepção na primeira relação sexual e em 1998, 25% dos partos realizados no Sistema Único da Saúde (SUS), foram de adolescentes.
Considerando que aproximadamente 40% das adolescentes engravidam até 3 anos da primeira gestação, a questão torna-se ainda mais preocupante.
No mundo moderno, escolaridade e capacitação profissional são fundamentais para inserção do jovem no mercado de trabalho, hoje tão escasso e competitivo. O mesmo ocorrendo para as jovens que já não veêm no casamento e na maternidade ideais de vida.
A ocorrência e a reincidência da gestação não programada, em pleno processo de capacitação e formação profissional, conduzirá invariavelmente os jovens, por necessidade de prover a nova família, à deserção escolar e sub-emprego, mantendo assim o ciclo da pobreza.
Num país pobre, eminentemente jovem como o Brasil ( 21% da população formada por adolescentes), a gestação na adolescência representa um grande desafio. Dos problemas envolvidos com a gravidez precoce, o biológico parece-nos o menor e mais contornável. Uma assistência pré-natal especializada, precoce e preferencialmente multidisciplinar, é capaz de minimizar o impacto biopsíquico da gestação para estas jovens. O principal impacto, porém, ainda é o social.
Ivana Fernandes Souza Ginecologista e Obstetra - Hebiatra Belo Horizonte Minas Gerais Membro da Diretoria de Publicações da ASBRA. 2000-2001 Membro da Diretoria da Associação Mineira de Adolescência - AMA - 2000-2001
Bibliografia
1. Simon C St, Kelly L, Singer D . Why pregnancy adolescents say they did not use contraceptives prior to conception. Journal of Adolescent Health,1996 19(1):48-53.
2. Coates V, Correa M.M. Implicações sociais do papel do pai. In: Maakaroun MF, Souza RP, Cruz AR. Tratado de Adolescência - Um Estudo Multidisciplinar. Rio de Janeiro: Editora de Cultura Médica,1991: 407-13.
3. Costa CFF. Gravidez na adolescência. In: Magalhães FSC e Andrade HSSM. GinecologiaInfanto Juvenil, Rio de Janeiro: Editora Medsi, 1998: 501-05.
4. Galvão L , Díaz J. Saúde Sexual e Reprodutiva no Brasil. Editora Hucitec – Population Concil, 1999, 389p.
5. Grossman E. Adolescência através dos tempos. Adolesc Latinoam 1998; 1(2): 68-73.
6. Jovens Acontecendo na Trilha das Políticas Públicas (2 vols) CNPD, Brasília, 1998.
7. Krauskopf D. Thames, P.L.A. Embarazo en la adolescência e Aspectos antropológicosdel embarazo de adolescentes. Comision Nacional de Atencion Integral al AdolescenteOrganizacion Panamericana de la Salud / OPS. Costa Rica,1996.
8. Maia Filho NL, NederVM, Maioral VFS, Pereira RT, Mathias L. Gravidez na adolescência três décadas de um problema social crescente. Revista GO Atual,1998 (7): 28 a 32.
9. Monteiro DLM. Cunha A A, Bastos A C. Gravidez na Adolescência. São Paulo, Revinter, 1998, 190p.
10. Schor N, Mota MSFT, Branco VC (orgs.) Cadernos Juventude Saúde e Desenvolvimento. Ministério da Saúde - Secretaria de Políticas de Saúde, Brasília, 1999. 11. Vieira EM, Fernandes MEL, Bailey P, Mackay A .Seminário Gravidez na Adolescência. Brasília, 1998.
11. Vieira EM, Fernandes MEL, Bailey P, Mackay A .Seminário Gravidez na Adolescência. Brasília, 1998.
http://ral-adolec.bvs.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-71302002000200002&lng=en&nrm=iso
2. Sobre a gravidez na adolescência
About adolescence pregnancy
Stella R. Taquette
Doutora em Medicina pela Universidade de São Paulo (USP/Ribeirão Preto); assessora especial da Secretaria Especial de Políticas Públicas para as Mulheres.
RESUMO
Este artigo tem por objetivo enriquecer o debate em torno do “fenômeno” da gravidez na adolescência, revelando a visão da autora, advinda de sua experiência no atendimento de crianças e adolescentes, de leituras de bibliografia sobre o tema, tanto científica como leiga, assim como de estudos empíricos.
UNITERMOS
Adolescência; gravidez; sexualidade; gênero
ABSTRACT
This article intends to enrich the discussion about the “phenomenon” of adolescence pregnancy. It discloses the author’s opinion, based on her experience with children and adolescent care, the literature – scientific or not – and also empirical studies.
KEY WORDS
Adolescence; pregnancy; sexuality; gender
INTRODUÇÃO
A temática “gravidez na adolescência” está em pauta há vários anos no meio acadêmico e na sociedade como um todo. A gestação nessa faixa etária é considerada precoce, indesejada, não-planejada e, consequentemente, um problema a ser solucionado. Vários estudos têm sido desenvolvidos, por pesquisadores de diversos campos, no intuito de compreender esse fenômeno complexo, cujas variáveis envolvidas são muitas e que para ser entendido precisa ser contextualizado e abordado dialeticamente. Apesar disso, o senso comum reflete uma realidade parcial e reducionista, que colabora para manter a questão como problema exclusivo da adolescente que engravida. Ficam fora dessa análise o parceiro e o contexto social, cuja influência na sexualidade das pessoas não pode ser negada e muito menos desprezada ou ignorada.
Algumas afirmações do senso comum referentes a esse tema são dignas de destaque:
• adolescentes estão “transando” devido ao excesso de mensagens sexuais na mídia;
• adolescentes são imediatistas, imaturas, irresponsáveis e têm desejos intensos;
• adolescentes são promíscuas;
• adolescentes ficam grávidas por falta de informação contraceptiva e porque não sabem usar contraceptivos;
• os pais são muito permissivos com as filhas adolescentes e não conversam com elas;
• o controle da natalidade pode reduzir a fecundidade das adolescentes das classes menos favorecidas e com isso reduzir a pobreza e a violência nas grandes metrópoles brasileiras.
Observamos essas opiniões não só na população geral, mas também dentro da própria área da saúde, entre aqueles profissionais que não lidam diretamente com adolescentes.
PESQUISAS E REFLEXÕES SOBRE GESTAÇÃO NA ADOLESCÊNCIA
Pesquisas e reflexões revelam que atualmente a gravidez na adolescência é vista por alguns quase como uma doença a ser prevenida. Entretanto, quando consideramos o passado, vemos que nossas avos e bisavós foram mães adolescentes e isso era encarado de forma natural. A faixa etária adolescente foi, por muito tempo, considerada a ideal para a mulher ter filhos. Hoje já não se pensa assim, pois se considera que a gravidez provoca a interrupção de um processo de crescimento e amadurecimento e resulta em perdas de oportunidades. É uma idade propícia à escolarização, ao inicio da vida profissional e ao exercício da sexualidade desvinculado da reprodução. Da mesma forma, fala-se numa erotização precoce das crianças, devido à abundância de mensagens sexuais na mídia e à maior liberdade sexual. No entanto, nos séculos passados, era comum as crianças brincarem com os próprios genitais sem que isso configurasse prática erótica(1).
A gravidez na adolescência, aos olhos do senso comum e da mídia, apresenta-se como um problema muito mais sério do que, por exemplo, as doenças sexualmente transmissíveis (DSTs), essas, sim, que deveriam ser prevenidas. Não raro pais e mães levam suas filhas adolescentes ao médico para que este lhes receite pílulas anticoncepcionais. Por outro lado, não vemos a mesma preocupação com os rapazes e nem com a prevenção de DSTs.
Algumas indagações perante situações observadas ficam sem resposta em razão da dificuldade em respondê-las. A gravidez em adolescentes é vista como de risco médico, psicológico e social. O discurso da medicina aponta que a gestante adolescente apresenta maior incidência de doença hipertensiva da gravidez, de parto prematuro e de bebês com baixo peso ao nascer (1, 5, 10, 14). Do ponto de vista psicológico, mães adolescentes são rotuladas de imaturas e portanto sem capacidade de cuidar apropriadamente de seus filhos, aumentando o risco de acidentes e de infecções (13). Socialmente, a gravidez na adolescência resultaria numa perda de oportunidades e perspectivas de ascensão social devido ao abandono escolar e ao aumento das famílias monoparentais, o que agravaria a pobreza e levaria a uma maior probabilidade de comportamentos anti-sociais e consequente envolvimento com crimes(12).
Estudos revelam que a gravidez na adolescência frequentemente está associada a graves problemas psicossociais, como alcoolismo, famílias desestruturadas, baixo nível socioeconômico, carências de ordem afetiva, principalmente da figura paterna (8, 18). A ausência do pai e antecedentes como história familiar de gravidez, baixa renda e repetência ou abandono escolar também foram evidenciados por Persona et al. (16), em pesquisa sobre repetição da gravidez na adolescência.
Outros estudos corroboram esses achados e destacam, porém, que a gravidez não necessariamente representa ruptura ou abandono de projetos de vida. As adolescentes mães se sentem mais valorizadas pela sociedade, adquirem outro status, que lhes permite maior mobilidade social e realização de projetos (15). Por outro lado, ao ouvir adolescentes que engravidaram, observamos situações diversas de envolvimento afetivo. Às vezes a gravidez é inesperada, mas desejada inconscientemente; em outras é até programada. Em geral, a gravidez é decorrência de um envolvimento afetivo e sentida como acontecimento positivo, que coloca em evidência a sexualidade juvenil e oferece maior autonomia às adolescentes (11).
SEXUALIDADE HUMANA E A ENTRADA NA VIDA ADULTA
A sexualidade humana nunca foi vivenciada de forma livre. Em todas as épocas da humanidade sofreu e sofre algum tipo de interdição, que é variável conforme o momento histórico e social. Segundo a visão da antropologia social, a primeira interdição à sexualidade, o tabu do incesto, é fundamento da cultura humana. Antes de se organizar em sociedade o homem vivia, como os macacos superiores, em hordas de várias fêmeas chefiadas por um macho que ordenava a morte de todos os machos que nascessem. A partir da sobrevivência de alguns, surgiram novas hordas em que eram proibidas as relações sexuais entre parentes, no intuito de proliferar a espécie. Em outras épocas, diferentes proibições surgiram por diversos motivos: econômicos, religiosos etc. (9).
Na sociedade contemporânea, vivemos uma época de maior liberdade sexual desde o advento dos contraceptivos hormonais orais, que proporcionaram a desvinculação quase total entre sexualidade e reprodução. Hoje, na maioria das camadas sociais, é aceita a atividade sexual antes do casamento, e a mulher conquistou maior independência para desfrutar do prazer do sexo, anteriormente prerrogativa apenas do homem. Alem disso, houve intensificação das mensagens sexuais veiculadas pela mídia, o que certamente proporcionou alguma influência no exercício sexual das pessoas.
Entretanto, apesar da maior liberdade e do estímulo a atividade sexual, vemos uma diversidade de experiências entre os jovens. Nessa etapa da vida, os indivíduos são muito influenciados pelo meio externo à família, pois se encontram num necessário momento de afastamento dos seus pais. Esses, apesar de perceberem o que acontece com a vida sexual dos filhos, não conseguem orientá-los efetivamente, pois não se consideram aptos para falar de sexualidade ou de métodos contraceptivos (6).
Na adolescência, há um natural abandono dos ideais infantis, uma busca de novos ideais no meio social e uma separação progressiva dos pais. Ocorrem escolhas de novos laços sociais e afetivos. Nesse momento, o grupo de iguais exerce enorme influência, impondo normas e regras sob forma de modelos, comportamentos, costumes, leis e práticas diversas.
Os jovens, portanto, são muito suscetíveis às influências do grupo de iguais. Dependendo do ambiente social em que vivem, suas atitudes perante o sexo diferem. Há grupos com regras bem divergentes dos demais. Por exemplo, aqueles associados à religião cristã são orientados a se manterem castos até o casamento. Outros são implicados em grupos que refletem a cultura funk, que estimula, por meio da música, um exercício sexual precoce altamente associado ao prazer. Novos grupos surgem a cada momento. Não podemos esquecer da forte influencia das questões de gênero na sexualidade. Esse sistema impõe regras que são incorporadas como naturais, mas que na verdade são socialmente construídas. Os homens são estimulados a iniciar a atividade sexual precocemente e a exercitá-la sempre. Já as mulheres devem-se guardar e são desvalorizadas quando assumem um comportamento semelhante aquele que é esperado do homem. Nessa visão de construção social do comportamento sexual, é bom destacarmos também a intolerância às expressões homossexuais. Um movimento interessante é assumido pelo grupo de emotional hardcores (EMOs), que vivem o sexo com liberdade e afeto e aceitam os relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo, diferindo, portanto, dos demais indivíduos de mesma faixa etária.
Em pesquisa qualitativa realizada por meio de reuniões em grupos focais e entrevistas individuais semi-estruturadas, foram discutidos temas relacionados com a sexualidade, ficando patente que a moral social, a família, o grupo de iguais e o nível socioeconômico exercem enorme influência no comportamento sexual dos jovens. Os resultados indicaram que as adolescentes que têm um investimento afetivo familiar se apropriam mais de sua sexualidade, agem com maior proteção e não se submetem meramente à satisfação dos desejos de outrem, pois se tornam mais sujeitos de sua própria sexualidade (17).
Estudos revelam que hoje o desejo sexual é vivenciado de forma mais livre, e o sexo por prazer vem substituindo o mito do amor romântico (7). A idade média do primeiro intercurso sexual é mais baixa, por volta de 15 e 14 anos, para meninas e meninos, respectivamente(12). E, apesar da imagem social de promiscuidade da adolescência, pesquisa nacional verificou que cerca de 70% dos jovens sexualmente ativos de todas as faixas etárias referem somente a um parceiro sexual(4). Verifica-se que as práticas sexuais são diversas, assim como o perfil reprodutivo dos jovens (3).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Podemos constatar que as opiniões variadas e simplificadas sobre a gravidez na faixa etária da adolescência não conseguem explicar, muito menos comprovar, uma relação de causalidade. Esse fenômeno é complexo, carregado de subjetividade e de influências sociais.
A gravidez na adolescência está associada à baixa escolaridade e ao baixo nível socioeconômico. A solução que se apresenta nas políticas públicas de saúde e educação é a do planejamento familiar, com forte ênfase nos métodos contraceptivos. E como se disséssemos: adolescentes pobres e com pouca escolaridade não devem ter filhos. Não seria mais justo resolver o problema da gravidez na adolescência investindo em melhores condições de vida (aumentar a escolaridade e as oportunidades de ascensão social e melhorar a renda) para que as pessoas tenham o direito e a possibilidade de escolher em que momento ter ou não filhos?
Para finalizar, vale transcrever a fala de uma adolescente que representa de forma contundente os questionamentos aqui apresentados. Ela exemplifica, singularmente, como as adolescentes brasileiras, desprovidas de afeto e cidadania, reduzem seus sonhos de realização, como pessoa e como mulher, ao casamento e a maternidade:
“...um dia eu quis ser alguém na vida, assim, ser advogada, médica, dentista. Mas hoje eu acho que eu já desiludi. Eu não quero ser mais nada. Quero apenas ser dona de casa. Casar e ser dona de casa” (Liliane, 15 anos).
REFERÊNCIAS
1. Almeida MCC, Aquino EML, Barros AP. Trajetória escolar e gravidez na adolescência entre jovens de três capitais brasileiras. Cad Saúde Publica. 2006; 22(7): 1397-409.
2. Aries P. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: Guanabara. 1981.
3. Borges ALV, Shor N. Trajetórias afetivo-amorosas e perfil reprodutivo de mulheres adolescentes residentes no Município de São Paulo. Rev Bras Saúde Mater Infant. 2005; 5(2): 163-70.
4. Castro MG, Abramovay M, Silva LB. Juventudes e sexualidade. Brasília: UNESCO. 2004.
5. Dias AB, Aquino EML. Maternidade e paternidade na adolescência: algumas constatações em três cidades do Brasil. Cad Saúde Publica. 2006; 22(7): 1447-58.
6. Dias ACG, Gomes WB. Conversas sobre sexualidade na família e gravidez na adolescência: a percepção dos pais. Est Psicol. 1999; 4(1): 79-106.
7. Dias ACG, Gomes WB. Conversas, em família, sobre sexualidade e gravidez na adolescência: percepção das jovens gestantes. Psicol Reflex Crit. 2000; 13(1): 109-25.
8. Figueiro AC. Condições de vida e saúde reprodutiva de adolescentes residentes na comunidade de Roda de Fogo, Recife. Rev Bras Saúde Mater Infant. 2002; 2(3): 291-302.
9. Freud S. Obras completas. Tomo II: Totem e tabu. Madrid: Biblioteca Nueva. 1981.
10. Gama SGN, Szwarcwald CL, Leal MC, et al. Gravidez na adolescência como fator de risco para baixo peso ao nascer no Município do Rio de Janeiro, 1996 a 1998. Rev Saúde Pública. 2001; 35(1): 74-80.
11. Goncalves H, Gigante D. Trabalho, escolaridade e saúde reprodutiva: um estudo etno-epidemiológico com jovens mulheres pertencentes a uma coorte de nascimento. Cad Saúde Pública. 2006; 22(7): 1459-69.
12. Heilborn ML, Salem T, Rohden F, et al. Aproximações socioantropológicas sobre a gravidez na adolescência. Horiz Antropol. 2002; 8(17): 13-45.
13. McAnarney ER, et al. Interactions of adolescent mothers and their 1-year-old children. Pediatrics. 1986; 78(4): 585-90.
14. Michelazzo D, Yazlle MEHD, Mendes MC, et al. Indicadores sociais de grávidas adolescentes: estudo caso-controle. Rev Bras Ginecol Obstet. 2004; 26(8): 633-9.
15. Pantoja ALN. “Ser alguém na vida”: uma analise sócio-antropológica da gravidez/maternidade na adolescência, em Belem do Para, Brasil. Cad Saúde Publica. 2003; 19(supl. 2): S335-S43.
16. Persona L, Shimo AKK, Tarallo MC. Perfil de adolescentes com repetição da gravidez atendidas num ambulatório de pré-natal. Rev Lat Am Enf. 2004; 12(5): 745-50.
17. Taquette SR. Iniciação sexual da adolescente. São Paulo: 1997. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto.
18. Taquette SR. Sexo e gravidez na adolescência: estudo de antecedentes biopsicossociais. J Pediatr. 1992; 68(3/4): 135-9.
19. Taquette SR, Vilhena MM, Paula MC. Doenças sexualmente transmissíveis e gênero: um estudo transversal entre adolescentes no Rio de Janeiro. Cad Saúde Publica. 2004; 20(1): 282-90.
http://www.fqm.com.br/Site/br/docs/as022008.pdf
domingo, 15 de fevereiro de 2009
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário